Manifesto aos descrentes no amor e na sorte

Triste de quem fica desiludido(a) e evita outro amor de novo, cai no conto, blasfema, diz “tô fora”, já era, tira onda, ri de quem ama, pragueja e nunca mais se encontra dentro das próprias vestes.

Como se o amor fosse uma bodega de lucros, fiado só amanhã, um comércio, como se dele fosse possível sair vivo, como nunca tivesse ouvido aquela parada de Camões, a do fogo que arde e não se sente, a da ferida, aquela, o Renato Russo musicou e tudo, lembra?

Triste de quem nem sabe se vingar do baque, sequer cantarola, no banheiro ou no botequim, “só vingança, vingança, vingança!”, o clássico de Lupícinio Rodrigues, o inventor da dor-de-cotovelo, a esquina dos ossos úmero com os ossos ulna (antigo cúbito) e rádio, claro, lição da anatomia e da espera no balcão da existência.

Tudo bem não querer repetir, com a mesma maldita pessoa, os mesmos erros, discussões, barracos e infernos avulsos e particularíssimos. Falar nisso, nunca mais ouvi o velho e bom “eles renovaram o namoro”. Coisa linda, linda, linda, o mais comum era dizer apenas “eles renovaram”. Prestaram atenção na força das palavras?

É isso. Triste de quem encerra o afeto de vez, como se aquela mulher e/ou aquele homem “x” fossem fumar o king size, duvidoso e sem filtro, lá fora, e representassem o último dos humanos.

Chega do clichê e do chavão de que todos os homens ou mulheres são iguais.

São, mas não são, senhoras e senhores. Cada vez que uma folha se mexe no universo a vida é diferente.

Todos os machos e todas as fêmeas são novidades. Podem até ser piores, uns mais do que os outros, porém dependem de vários fatores. Não adianta chamar o garçom do amor e passa a régua para sempre por causa de apenas um(a) sujeito(a) –como se representassem a parte pelo todo da panelinha do mundo.

O que não vale mesmo é eliminar o amor como proposta mínima na plataforma política de estar vivo.

Já pensou quantos amores possíveis, como diria o Calvino, você estaria dispensando por essa causa errada?

E quem disse que amor é para dar certo?

Amor é uma viagem. De ácido.

Amar é... dar ou levar pé-na-bunda.

Depois, como se diz, a fila anda, mesmo que mais demorada que a do velho INPS ou do que a dos ingressos para a final do campeonato.

E tem mais: a única vacina para um amor perdido é um novo amor achado. Vai nessa, aconselho! Só cura mesmo com outro.

Sim, o amor acaba, se não entenderam ainda... corram a ler o gênio mineiro Paulo Mendes Campos: em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba.

Vamos esquecer a ilusão católica do "até que a morte separe" os pombinhos. Vamos viver lindamente o amor e o seu calendário próprio. Muitas vezes não temos o amor da vida, mas temos um belo amor da quinzena, que de tão intenso e quente logo derrete.

Foi bonito, mesmo líquido.

Vale tudo, só não vale o fastio e a descrença.

Um comentário: